(Nisto Cremos)
Ao longo da História, existiram aqueles que exageraram eloqüentemente a respeito dos horrores do inferno, explorando os temores das pessoas na tentativa de conduzi-las à adoração de Deus. Mas que espécie de deus retratam essas pessoas?
De que modo extinguirá Deus finalmente o mal? Que acontecerá com Satanás? O que impedirá que o mal torne algum dia a erguer sua horrorosa feição?
De que modo pode um Deus justo ser também amável?
Eventos do Começo do Milênio
Durante o milênio – o período de mil anos do qual fala o vigésimo capítulo de Apocalipse – a influência de Satanás sobre a Terra será restrita, e Cristo estará reinando com os santos (Apoc. 20:1-4).
O Segundo Advento. Apocalipse 19 e 20 constituem um só conjunto; não há quebra de seqüência entre ambos. Descrevem a vinda de Cristo (Apoc. 19:11-21) e prosseguem imediatamente com o milênio, sendo que essa seqüência indica que o milênio começará por ocasião do retorno de Cristo.
O Apocalipse representa os três poderes que reúnem as nações do mundo com o objetivo de opor-se à obra e ao povo de Cristo, imediatamente antes do Segundo Advento, como sendo o dragão, a besta e o falso profeta (Apoc. 16:13).
Quando “a besta e os reis da Terra, com os seus exércitos” se ajuntam para fazer guerra contra Cristo por ocasião de Seu retorno, a besta e o falso profeta são destruídos (Apoc. 19:19 e 20). O que segue em Apocalipse 20 – o capítulo do milênio – refere-se ao terceiro membro da tríade demoníaca, o dragão. Ele é aprisionado e lançado no poço do abismo, onde permanece durante os 1.000 anos.1
Conforme vimos no capítulo 24, é mediante o segundo advento de Cristo, quando os reinos deste mundo são destruídos, que Deus estabelece o Seu reino de glória – um reino que persistirá para sempre (Dan. 2:44). Será então que Seu povo começará a reinar.
A Primeira Ressurreição. No Segundo Advento, ocorre a primeira ressurreição. Os justos, os “benditos e santos”, erguem-se dos túmulos – “sobre esses a segunda morte não tem autoridade; pelo contrário, serão sacerdotes de Deus e de Cristo e reinarão com Ele os mil anos” (Apoc. 20:6; veja o capítulo 25 deste livro).
Os Justos Vão Para o Céu. Após a ressurreição dos justos mortos, estes e os justos vivos são reunidos “para o encontro do Senhor nos ares” (I Tess. 4:17).
Então Jesus cumprirá a promessa que fez imediatamente antes de deixar este mundo: “Vou preparar-vos lugar. E, quando Eu for e vos preparar lugar, voltarei e vos receberei para Mim mesmo, para que, onde Eu estou, estejais vós também” (João 14:2 e 3). Jesus descreve o lugar para onde conduzirá Seus seguidores como a “casa de Meu Pai”, onde existem “muitas moradas” ou lugares de habitação (João 14:2). Aqui, Jesus Se refere à Nova Jerusalém, a qual não virá à Terra até o fim do milênio. Assim, no Segundo Advento, quando os justos se encontram com o Senhor “nos ares”, seu destino é o Céu – e não a Terra que acabaram de deixar.2
Cristo não estabelecerá Seu reino de glória na Terra nessa oportunidade. Ele o fará somente no final do milênio.
Os Inimigos de Cristo São Mortos. Cristo comparou o Seu retorno com aquilo que aconteceu por ocasião do Dilúvio e na destruição de Sodoma e Gomorra (Mat. 24:37-39; Luc. 17:28-30). Essa comparação revela dois pontos: em primeiro lugar, que a destruição atingiu os ímpios de surpresa; em segundo, que aquilo que sobreveio foi efetivamente destruição – o Dilúvio veio “e os levou a todos” (Mat. 24:39). O fogo e enxofre que desceu sobre Sodoma e Gomorra “e destruiu todos” (Luc. 17:29; Mat. 24:39). Em Seu segundo Advento, Cristo descerá dos Céus com Seus exércitos, na qualidade de cavaleiro que monta um cavalo branco, e cujo nome será REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES.
Virá para destruir as nações rebeldes da Terra. Depois da destruição da besta e do falso profeta, os “restantes” dos seguidores de Satanás morrerão e não haverá sobreviventes, pois todos serão “mortos com a espada que saía da boca dAquele que estava montado no cavalo. E todas as aves se fartaram das suas carnes” (Apoc. 19:21).3
Descrevendo essa cena, dizem as Escrituras: “O Senhor sai do Seu lugar, para castigar a iniqüidade dos moradores da Terra; a Terra descobrirá o sangue que embebeu e já não encobrirá aqueles que foram mortos” (Isa. 26:21).
A Terra Torna-se Desolada. Uma vez que os salvos ascendem para a companhia do Senhor e os ímpios são destruídos mediante o Seu aparecimento, a Terra permanecerá durante algum tempo sem habitantes humanos.
As Escrituras indicam essa situação. O profeta Jeremias disse: “Olhei para a Terra, e ei-la sem forma e vazia; para os Céus, e não tinham luz. Olhei para os montes, e eis que tremiam, e todos os outeiros estremeciam. Olhei, e eis que não havia homem nenhum, e todas as aves dos céus haviam fugido” (Jer. 4:23-25). Jeremias utiliza a terminologia encontrada em Gênesis 1:2, “sem forma e vazia”, indicando que a Terra se tornará tão caótica como o era ao começo da Criação.
Satanás é Preso. Os eventos que ocorrem nessa oportunidade foram prefigurados no ritual do bode emissário, no Dia da Expiação, nos serviços do santuário de Israel. No Dia da Expiação, o sumo sacerdote purificava o santuário mediante o sangue expiatório do bode do Senhor. Somente depois que a expiação se achava completa é que o ritual envolvia Azazel, o bode que simbolizava Satanás (veja o capítulo 23). Colocando as mãos sobre a cabeça desse bode, o sumo sacerdote confessava “todas as iniqüidades dos filhos de Israel, todas as suas transgressões e todos os seus pecados”, colocando-os sobre a cabeça do bode (Lev. 16:21). Depois, o bode era enviado para o deserto, para a “terra solitária” (Lev. 16:22).
Similarmente, Cristo, no santuário celestial, tem ministrado os benefícios de Sua completa expiação ao Seu povo; em Seu retorno Ele os redimirá e lhes dará a vida eterna. Quando Ele houver completado Sua obra de redenção e purificação do santuário celestial, colocará os pecados de Seu povo sobre Satanás, o originador e instigador do mal. De nenhuma forma se pode dizer que é Satanás quem efetua a expiação pelos pecados dos crentes – Cristo realizou essa obra por completo. Mas Satanás deve ser responsabilizado por todos os pecados que ele levou os salvos a praticarem. Assim como o bode emissário era conduzido ao deserto por um “homem à disposição para isso”, assim Deus banirá Satanás para a Terra desolada e desabitada (veja o capítulo 23 deste livro).4
A visão que João teve do milênio, descreve em traços vívidos o banimento de Satanás. Ele viu que no começo dos mil anos, “o dragão, a antiga serpente, que é o diabo, Satanás”, foi posto em cadeias e confinado ao “abismo” (Apoc. 20:2 e 3). Isso retrata simbolicamente a cessação temporária das atividades de perseguição e engano de Santanás; “para que não mais enganasse as nações até se completarem os mil anos” (Apoc. 20:3).
O termo utilizado por João – abismo, do grego abussos – descreve apropriadamente as condições da Terra naquela oportunidade.5 Bombardeada pelas sete últimas pragas que antecedem imediatamente a volta de Cristo (Apoc. 16:18-21) e coberta com os cadáveres dos ímpios, será a Terra um lugar da mais completa desolação.
Confinado à Terra, Satanás estará “preso” por meio de uma cadeia de circunstâncias. Uma vez que sobre a Terra não existe qualquer vida humana, Satanás não tem a quem tentar ou perseguir. Ele está preso no sentido de não ter nada para fazer.
Eventos Durante o Milênio
Cristo no Céu com os Remidos. Em Sua segunda vinda, Cristo conduz Seus seguidores para o Céu, para os lugares de morada que Ele lhes preparou na Nova.
Jerusalém. Tal como Moisés e os israelitas, os redimidos, possuídos de imensa gratidão, entoarão um cântico de livramento – “o cântico de Moisés, servo de Deus, e o cântico do Cordeiro, dizendo: Grandes e admiráveis são as Tuas obras, Senhor Deus, todo-poderoso! Justos e verdadeiros são os Teus caminhos, ó Rei das nações!” (Apoc. 15:3).
Os Santos Reinam Com Cristo. É durante o milênio que Cristo cumprirá a promessa de conceder aos vencedores o “poder sobre as nações” (Apoc. 2:26).
Daniel viu que após a destruição dos inimigos de Deus, “o reino, e o domínio, e a majestade dos reinos debaixo de todo o Céu serão dados ao povo dos santos do Altíssimo” (Dan. 7:27). Aqueles que são ressuscitados por Cristo na primeira ressurreição, irão reinar com Ele durante os mil anos (Apoc. 20:4).
Mas em que sentido poderão os santos reinar se estão no Céu e todos os ímpios estão mortos? Seu reinado consistirá no envolvimento em uma importante fase do governo de Cristo.6
O Julgamento dos Maus. João viu que durante o milênio os santos estariam envolvidos em julgamento; ele contemplou “tronos, e nestes sentaram-se aqueles aos quais foi dada autoridade de julgar” (Apoc. 20:4). Essa é a ocasião do julgamento de Satanás e de seus anjos, mencionada nas Escrituras (II Ped. 2:4; Jud. 6). É a ocasião mencionada por Paulo, de que os santos haverão de julgar o mundo e mesmo os anjos (I Cor. 6:2 e 3).7
O julgamento que ocorre durante o milênio não decide quem está salvo ou perdido. Essa decisão é tomada por Deus antes do Segundo Advento; todos aqueles que não participaram da primeira ressurreição ou não foram transformados, estão perdidos. O julgamento de que os santos participam serve ao propósito de responder qualquer questão que os justos possam ter em relação às causas que levaram outros a se perderem. Deus deseja que aqueles aos quais foi dada a vida eterna tenham plena confiança em Sua direção, de modo que Ele lhes revelará as operações de Sua misericórdia e justiça.
Imagine que você esteja no Céu e ali não se encontre um de seus familiares, alguém que você tinha “certeza” de que ali estaria. Tal situação poderia levar ao questionamento da justiça de Deus – e esta espécie de dúvida jaz à base de todo o pecado. A fim de eliminar para sempre a possibilidade de tais dúvidas – e para garantir que o pecado nunca mais se erguerá – Deus proverá as respostas a todas as perguntas desse tipo durante a fase revisora do julgamento, que acontecerá no milênio.
Nessa tarefa, os remidos desempenharão um papel crucial no grande conflito entre o bem e o mal. “Eles confirmarão, para sua eterna satisfação, quão sincera e pacientemente Deus Se ocupou dos pecadores perdidos. Perceberão quão negligente e obstinadamente os pecadores desprezaram e rejeitaram Seu amor.
Descobrirão que mesmo pecadores aparentemente contritos acariciaram secretamente o medonho egoísmo em vez de aceitar o sistema de valores de seu Senhor e Salvador.”8
O Tempo de Reflexão de Satanás. Durante o milênio Satanás sofrerá intensamente. Confinado, junto com seus anjos, à Terra desolada, não mais poderá desenvolver os enganos que haviam lhe ocupado constantemente o tempo. É obrigado a contemplar os resultados de sua rebelião contra Deus e a sagrada lei; necessita ver agora o papel que desempenhou no grande conflito entre o bem e o mal. Pode olhar ao futuro tão-somente com temor diante da terrível penalidade que deverá sofrer em virtude de todo o mal pelo qual é responsável.
Eventos do Final do Milênio
No final do milênio, “os restantes dos mortos” – os ímpios – serão ressuscitados, libertando assim a Satanás da inatividade que o prendera (Apoc. 20:5 e 7). Enganando uma vez mais os ímpios, ele os conduz em ataque contra “o acampamento dos santos e a cidade querida [a Nova Jerusalém]” (Apoc. 20:9), a qual, junto com Cristo, terá descido do Céu nessa oportunidade.9
Cristo, os Santos e a Cidade Descem. Cristo desce novamente à Terra, com os santos e a Nova Jerusalém, tendo em vista dois propósitos. Porá término ao grande conflito ao executar as decisões do julgamento ocorrido durante o milênio, e purificará e renovará a Terra, de modo que possa aqui estabelecer Seu reino eterno. Então, em seu mais amplo sentido, “o Senhor será rei sobre toda a Terra” (Zac. 14:9).
A Ressurreição da Condenação. Chega, então, o momento em que se cumprirá plenamente a promessa de Cristo de que “todos os que se acham nos túmulos ouvirão a Sua voz” (João 5:28). Em Seu Segundo Advento, Cristo ressuscitara os justos mortos, naquela que é a primeira ressurreição, ou ressurreição da vida. Agora, ocorre a outra ressurreição mencionada por Cristo, a “ressurreição da condenação” (João 5:29). O Apocalipse também faz referência a essa ressurreição: “Os restantes dos mortos [aqueles que não participaram da primeira ressurreição] não reviveram até que se completassem os mil anos” (Apoc. 20:5).
Termina o Cativeiro de Satanás. A ressurreição dos ímpios no final do milênio libera a Satanás de seu cativeiro durante “pouco tempo” (Apoc. 20:3). Em sua última tentativa de desafio ao governo de Deus, ele “sairá a seduzir as nações que há nos quatro cantos da Terra” (Apoc. 20:8). Uma vez que os ímpios ressuscitaram no mesmo espírito rebelde que possuíam ao morrer, a tarefa de Satanás não será difícil.
O Ataque à Cidade. Em seu último engano, Satanás procurará inspirar nos ímpios a esperança de capturar o reino de Deus pela força. Reunindo todas as nações do mundo, ele as conduz contra a cidade santa (Apoc. 20:8 e 9).10 “Os ímpios que obstinadamente recusaram entrar na Cidade de Deus por meio dos méritos do sacrifício expiatório de Cristo, agora determinam-se a conseguir a entrada e controle da cidade através de cerco e batalha.”11
O fato de que os ímpios, tão logo recebem novamente de Deus a vida, volvem-se contra Ele e tentam derrubar Seu reino, confirma que a decisão que Deus tomou a respeito deles está correta. Dessa forma o nome e o caráter divinos, que Satanás tentou deslustrar, serão plenamente vindicados diante de todos.12
O Grande Trono Branco do Julgamento. João indica que quando os inimigos de Deus tiverem cercado a cidade santa e se acharem prontos para o ataque, Deus estabelecerá Seu grande trono branco. No momento em que toda a raça humana se encontra em volta do trono – alguns seguros dentro da cidade, outros fora, horrorizados na presença do Juiz – Deus executa a última fase de Seu juízo. Foi a respeito dessa ocasião que Jesus falou, dizendo: “Ali haverá choro e ranger de dentes, quando virdes, no reino de Deus, Abraão, Isaque, Jacó e todos os profetas, mas vós lançados fora” (Luc. 13:28).
Para que seja levada a efeito essa fase executiva do juízo de Deus, os livros são abertos. “Então, se abriram os livros. Ainda outro livro, o livro da vida, foi aberto. E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros” (Apoc. 20:12). Então, Deus pronuncia a sentença de condenação.
Por que Deus tira as pessoas das sepulturas tão-somente para extinguir-lhes a vida outra vez? Durante o milênio, os remidos tiveram a oportunidade de examinar a justiça do tratamento divino em relação a todas as criaturas inteligentes do Universo. Agora, a perda de todos os condenados – inclusive Satanás e seus anjos – confirmará a justiça dos caminhos de Deus.
Foi com relação a esse grande trono branco que Paulo escreveu, e cuja profecia se cumpre agora: “Todos compareceremos perante o tribunal de Deus” (Rom. 14:10). Ali, todas as criaturas – não caídas e caídas, salvas e perdidas – dobrarão os joelhos e confessarão que Jesus Cristo é Senhor (Filip. 2:10 e 11; cf. Isa. 45:22 e 23). Então a questão da justiça de Deus terá sido resolvida para sempre. Aqueles que herdarem a vida eterna possuirão, em relação a Ele, uma fé inabalável. Nunca mais o Universo ou seus habitantes serão postos sob o alcance do pecado.
Destruição de Satanás e dos Pecadores. Imediatamente após ser pronunciada a sentença, Satanás, seus anjos e seus seguidores humanos receberão a punição devida. Eles sofrerão a morte eterna. “Desceu... fogo do céu e os consumiu” (Apoc. 20:9). A própria superfície da Terra, fora da cidade santa, parece derreter-se, tornando-se um vasto lago de fogo para “juízo e destruição dos homens ímpios” (II Ped. 3:7). O “dia da vingança do Senhor” (Isa. 34:8), durante o qual Ele executará o Seu “estranho ato” (Isa. 28:21) de destruição dos inimigos, finalmente chegou. João complementa: “E, se alguém não foi achado inscrito no livro da vida, esse foi lançado para dentro do lago de fogo” (Apoc. 20:15). O diabo e seus associados sofrem a mesma sorte (Apoc. 20:10).
Todo o contexto bíblico deixa claro que esta “segunda morte” (Apoc. 21:8) que os ímpios sofrem, significa a sua total destruição. O que dizer, então, do conceito de um inferno que arde eternamente? Estudo cuidadoso mostra que a Bíblia não ensina a existência de tal inferno ou tormento.
1. Inferno. Biblicamente, “inferno é o lugar e estado de punição e destruição, pelo fogo eterno que ocorre na segunda vinda, daqueles que rejeitaram a Deus e a oferta de salvação em Cristo Jesus”.13
Várias versões bíblicas utilizam a palavra “inferno” para traduzir o termo hebraico sheol e seu correspondente grego hades. Esses termos em geral se referem à sepultura onde os mortos – tanto justos quanto ímpios – aguardam, em estado de inconsciência, a ressurreição (veja o capítulo 25 deste livro). Uma vez que o conceito atual de inferno difere muito daquele implicado nos termos hebraico e grego, bom número de versões modernas da Bíblia simplesmente evitam a palavra “inferno” e transliteram os termos originais, “sheol” e “hades”.
Em contraste, o termo grego geena, que o Novo Testamento igualmente traduz como “inferno”, denota um lugar de punição dos impenitentes pelo fogo.
Portanto, na Bíblia “inferno” nem sempre quer dizer a mesma coisa – e a incapacidade em distinguir isso tem conduzido a muita confusão.
Geena é derivado do hebraico Ge Hinnom, “vale de Hinom” – uma garganta existente ao lado sul de Jerusalém. Nesse lugar, o povo de Israel havia celebrado o rito pagão de oferecer seus filhos, como holocausto, a Moloque (II Crôn. 28:3; 33:1 e 6). Jeremias predisse que em virtude dos pecados do povo, o Senhor converteria o vale num “Vale de Matança”, onde os cadáveres dos israelitas seriam sepultados até que não mais houvesse lugar para fazê-lo. Os cadáveres restantes serviriam de “pasto às aves” (Jer. 7:32 e 33; 19:6; Isa. 30:33). A profecia de Jeremias sem dúvida levou os israelitas a verem Ge Hinnom como um lugar de julgamento dos maus, um lugar de repugnância, punição e vergonha.14 Tradições rabínicas posteriores consideram o vale como lugar para a queima de carcaças e lixo.
Jesus utilizou os fogos de Hinom como representação do fogo do inferno (Mat. 5:22; 18:9). Assim, os fogos de Hinom simbolizavam o fogo consumidor do juízo final. Ele declarou que essa experiência ocorreria depois da morte (Luc. 12:5), e que o inferno destruiria tanto o corpo quanto a alma (Mat. 10:28).
Qual é a natureza do fogo do inferno? Porventura queimarão as pessoas para sempre?
2. A sorte dos ímpios. De acordo com as Escrituras, Deus promete vida eterna somente aos justos. O salário do pecado é morte, e não vida eterna no inferno (Rom. 6:23).
As Escrituras ensinam que os ímpios serão “exterminados” (Sal. 37:9 e 34); que eles perecerão (Sal. 37:20; 68:2). Não permanecerão em estado de consciência para sempre, mas serão abrasados (Mal. 4:1; Mat. 13:30 e 40; II Ped. 3:10). Serão destruídos (Sal. 145:20; II Tess. 1:9; Heb. 2:14), ou consumidos (Sal. 104:35).
3. Punição eterna. Falando da punição dos ímpios, o Novo Testamento utiliza os termos “eterno” ou “para sempre”. Esses termos traduzem a palavra grega aionios, e aplicam-se tanto a Deus quanto ao homem. Para evitar mal-entendidos, devemos recordar que aionios é um termo relativo; seu significado é determinado pelo objeto que ele modifica. Assim, quando as Escrituras utilizam aionios em relação a Deus, isto significa que Ele possui existência infinita – pois Deus é imortal. Quando, porém, a palavra é utilizada em relação a seres humanos mortais ou a coisas perecíveis, seu sentido se restringe ao período em que a pessoa ou coisa prossegue existindo.
Judas 7, por exemplo, diz que Sodoma e Gomorra “são postas para exemplo de fogo eterno, sofrendo punição”. É evidente que estas cidades não estão queimando até hoje. Pedro disse que tal fogo reduziu aquelas cidades a cinzas, condenando-as à destruição (II Ped. 2:6). O fogo “eterno” ardeu até que nada mais houvesse para queimar, extinguindo-se então (Jer. 17:27; II Crôn. 36:19).
Similarmente, quando Cristo destina os maus para o “fogo eterno” (Mat. 25:41), esse fogo que consumirá os ímpios será “inextinguível” (Mat. 3:12).
Somente apagará quando nada mais houver para ser queimado.15
Quando Cristo Se referiu ao “castigo eterno” (Mat. 25:46), não estava querendo dizer “ato de castigar eternamente”. O significado era que a “vida eterna [que os justos desfrutarão] continuará pelos séculos intérminos da eternidade; e que a punição [sofrida pelos ímpios] também será eterna – não uma duração eterna do sofrimento consciente, mas uma punição que será completa e final. O fim daqueles que assim sofrem é a segunda morte. Essa morte será eterna, pois dela não deverá, e não poderá, haver ressurreição.”16
Quando a Bíblia fala de “eterna redenção” (Heb. 9:12) e “juízo eterno” (Heb. 6:2), ela se refere aos eternos resultados de redenção e julgamento – não a um processo interminável de redimir e julgar. Da mesma forma, quando fala de punição eterna, está falando dos resultados e não do processo. A morte experimentada pelos ímpios é final e eterna.
4. Atormentados para sempre e sempre. A Escritura utiliza também a expressão “pelos séculos dos séculos” (Apoc. 14:11; 19:3; 20:10), o que tem contribuído para a conclusão de que o castigo de Satanás e dos ímpios perdurará ao longo de toda a eternidade. Entretanto, assim como ocorre com “eterno”, o objeto modificado pela expressão “pelos séculos dos séculos” ou “para sempre”, determina o significado da própria expressão. Quando ela se associa a Deus, seu significado é absoluto – pois Deus é imortal; associada aos seres humanos mortais, seu significado é limitado.
A descrição que as Escrituras fazem da divina punição de Edom, constitui bom exemplo do uso da expressão. Isaías diz que Deus haveria de transformar aquele país em piche fervente, o qual “nem de dia nem de noite se apagará”, e que a fumaça desta queima “subirá para sempre”. De geração em geração ele jazeria deserto; ninguém passaria por ali “para todo o sempre”. Edom foi destruído, mas não mais se encontra ardendo. O “para sempre” durou até que a destruição foi completada.
Ao longo de toda a Escritura, transparece claramente que o “para sempre” possui limites. O Antigo Testamento diz que um escravo poderia servir a seu senhor “para sempre” (Êxo. 21:6), que o menino Samuel deveria morar no tabernáculo “para sempre” (I Sam. 1:22), e que Jonas pensou que permaneceria no ventre do grande peixe “para sempre” (Jon. 2:6). O Novo Testamento utiliza a expressão de modo similar; Paulo, por exemplo, aconselha Filemom a receber Onésimo “para sempre” (Fil. 15). Em todos estes casos, “para sempre” refere-se a “enquanto a pessoa viver”.
O Salmo 92:7 diz que os maus serão destruídos para sempre. Profetizando a grande conflagração final Malaquias disse: “Eis que vem o dia, e arde como fornalha; todos os soberbos e todos os que cometem perversidades serão como o restolho; o dia que vem os abrasará, diz o Senhor dos Exércitos, de sorte que não lhes deixará nem raiz nem ramo” (Mal. 4:1).
Uma vez que os ímpios – Satanás, anjos maus e pessoas impenitentes – são todos destruídos pelo fogo, tanto ramos quanto raízes, não mais haverá utilização adicional para a morte ou hades (veja o capítulo 25 deste livro). Estes também serão destruídos eternamente por Deus (Apoc. 20:14).
Assim, a Bíblia deixa bem claro que eterna é a punição-resultado, e não a punição-processo. É isso que representa a segunda morte. Dessa morte não há ressurreição; seus resultados são eternos.
O Arcebispo William Temple estava correto ao afirmar: “Uma coisa podemos afirmar com segurança: o tormento eterno deve ser eliminado. Se os homens não houvessem importado a noção grega e não bíblica da indestrutibilidade natural da alma do indivíduo, e então lessem o Novo Testamento com esta mensagem em mente, haveriam de obter deste [o Novo Testamento] a crença, não de um tormento eterno, mas de uma aniquilação. É o fogo que é chamado de ‘eterno’, não a vida lançada dentro dele.”17
Tendo sido executada completamente a penalidade determinada pela lei de Deus, acham-se satisfeitas as demandas da justiça. Novos céus e nova Terra proclamam a justiça do Senhor.
5. O princípio da punição. A morte é o resultado final do pecado. Como resultado do pecado, todos os que rejeitam a salvação oferecida por Deus, morrerão eternamente. Contudo, alguns pecaram flagrante e demoniacamente, deleitando-se com os procedimentos que praticaram, levando outras pessoas aos sofrimento. Outros viveram uma existência pacífica e de relativo valor moral, sendo que sua maior culpa será o fato de haverem rejeitado a salvação que provém de Cristo. Seria justo que todos sofressem igual punição?
Cristo deixou claro este ponto: “Aquele servo, porém, que conheceu a vontade de seu senhor e não se aprontou, nem fez segundo a sua vontade será punido com muitos açoites. Aquele, porém, que não soube a vontade de seu senhor e fez coisas dignas de reprovação levará poucos açoites. Mas àquele a quem muito foi dado, muito lhe será exigido; e àquele a quem muito se confia, muito mais lhe pedirão” (Luc. 12:47 e 48).
Indubitavelmente, aqueles que mais se rebelaram contra Deus, sofrerão mais do que aqueles que não o fizeram. Mas deveríamos entender seu sofrimento final em termos da “segunda morte” experimentada por Cristo na cruz. Ali, suportou Ele os pecados de todo o mundo. Foi a pavorosa separação de Seu Pai, ocasionada pelo pecado, que Lhe causou a maior agonia e sofrimento – uma angústia mental que está além de qualquer descrição. Assim ocorrerá com os pecadores perdidos.
Eles colherão o que semearam, não apenas durante esta vida, como também em sua destruição final. Em presença de Deus, a culpa que sentirão em virtude dos pecados que cometeram, causar-lhes-á sofrimento e agonia indescritíveis. Quanto maior a culpa, tanto maior a agonia. Satanás, o instigador e promotor do pecado, sofrerá mais que todos.18
A Purificação da Terra. Descrevendo o dia do Senhor, quando todo traço de pecado for extinto, Pedro diz: “Os céus passarão com estrepitoso estrondo, e os elementos se desfarão abrasados; também a Terra e as obras que nela existem serão atingidas” (II Ped. 3:10).
O fogo que destrói os ímpios, purifica a Terra da poluição do pecado. Das ruínas da Terra, Deus fará surgir “novo céu e nova Terra, pois o primeiro céu e a primeira Terra passaram” (Apoc. 21:1). Da Terra purificada, recriada – o lar eterno dos remidos – Deus banirá para sempre a tristeza, a dor e a morte (Apoc. 21:4).
Finalmente será extinta a maldição trazida pelo pecado (Apoc. 22:3).
Em vista da vinda do dia do Senhor, no qual pecadores impenitentes e pecado serão destruídos, Pedro aconselha a todos: “Visto que todas essas coisas hão de ser assim desfeitas, deveis ser tais como os que vivem em santo procedimento e piedade.” Baseando sua esperança na promessa do retorno de Cristo, ele afirmou:
“Nós... segundo a Sua promessa, esperamos novos céus e nova Terra, nos quais habita justiça. Por essa razão, pois, amados, esperando estas coisas, empenhai-vos por ser achados por Ele em paz, sem mácula e irrepreensíveis” (II Ped. 3:11, 13 e14).
Referências
1. Veja SDA Bible Commentary, edição revista, vol. 7, pág. 885.
2. Veja Questions on Doctrine, pág. 495.
3. “Quando a besta e o falso profeta são lançados no lago de fogo (Apoc. 19:20), ‘o remanescente’ (Apoc.
19:21), ou o ‘restante’ de seus seguidores são mortos pela espada de Cristo. Esses são os reis, capitães, homens poderosos, ‘todos os homens, tanto livres quanto escravos’ (Apoc. 19:18). As mesmas classes são mencionadas sob o sexto selo, como procurando esconder-se da face do Cordeiro (Apoc. 6:14-17), quando os céus se enrolam como um pergaminho e toda montanha e ilha se move de seu lugar. Evidentemente esses textos descrevem o mesmo evento avassalador, a segunda vinda de Cristo.
“Quantos estarão envolvidos na morte do ‘remanescente’ (Apoc. 19:21)? De acordo com Apoc. 13:8, haverá sobre a Terra, por ocasião do advento, apenas duas classes de pessoas: ‘todos os que habitam sobre a terra adorarão [a besta], aqueles cujos nomes não estão inscritos no livro da vida’. Torna-se evidente, portanto, que ao o ‘remanescente’ ser morto pela espada (Apoc. 19:21), não haverá sobreviventes, exceto aqueles que triunfaram sobre a besta, ou seja, aqueles cujo nome está inscrito no livro da vida (Apoc. 13:8)” (SDA Bible Commentary,edição revista, vol. 7, pág. 885).
4. Cf. Questions on Doctrine, pág. 500. O bode emissário não é o salvador dos justos.
5. A Septuaginta utiliza essa expressão para traduzir o hebraico tehon, “profundo”, em Gên. 1:22. Isso indica que a condição da Terra durante o milênio reflete pelo menos em parte as condições da Terra no princípio, quando ela era “sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo”. Veja SDA Bible Commentary, edição revista, vol. 7, pág. 879.
6. O fato de que eles reinam, ou possuem domínio, não significa necessariamente que deva haver pessoas más que vivem sobre a Terra. No princípio, Deus deu a Adão e Eva o domínio (Gên. 1:26). Antes de pecarem, reinaram sobre a parcela da criação que Deus colocou sob a sua jurisdição. Para que alguém reine, não é necessário que tenha súditos ingovernáveis.
7. SDA Bible Commentary, edição revista, vol. 7, pág. 880.
8. Maxwell, God Cares (Boise, ID: Pacific Press, 1585), vol. 2, pág. 500.
9. O quadro descritivo que o Apocalipse faz da descida da Nova Jerusalém não necessariamente indica o tempo exato do acontecimento, pois no capítulo anterior vimos a “cidade querida” cercada pelos exércitos do demônio. Esse cenário leva à conclusão de que a Nova Jerusalém deve ter descido antes da restauração da Terra.
10. Os nomes Gogue e Magogue achavam-se associados aos inimigos de Israel, os quais haveriam de atacar o povo de Deus e Jerusalém depois do exílio (Ezeq. 38:2 e 14-16). Várias das profecias relacionadas com o antigo Israel não se cumpriram. Assim, a poderosa confederação inimiga da qual Ezequiel falou como dirigindo-se contra Jerusalém, manifestar-se-á quando Deus permitir que Satanás, com o seu exército de perdidos, venha contra Seu povo e Sua cidade querida para a batalha final do grande conflito.
11. Questions on Doctrine, pág. 505.
12. Cf. SDA Bible Commentary, edição revista, vol. 4, pág. 708.
13. “Hell”, SDA Encyclopedia, edição revista, pág. 579.
14. Veja “Hell”, SDA Dictionary, edição revista, pág. 475.
15. Verifique a profecia de Jeremias quanto à destruição de Jerusalém com fogo “que não se apagará” (Jer. 17:27), a qual se cumpriu quando Nabucodonosor tomou a cidade (II Crôn. 36:19). O fogo queimou até que a cidade foi destruída, e depois se extinguiu.
16. Questions on Doctrine, pág. 539.
17. William Temple, Christian Faith and Life (Nova Iorque: Macmillan, 1931), pág. 81.
18. Cf. “Hell”, SDA Bible Dictionary, edição revista, pág. 475.